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No Brasil a prescrição de psicofármacos pode ser considerada uma prática ainda não reformada, tendo em vista que, pesquisas recentes apontam para o baixo empowerment dos usuários em relação a seus tratamentos medicamentosos, deixando o poder desta decisão a critério apenas dos profissionais de saúde. Considerando isso, utilizamos o “medicamento” como gatilho para analisar o conflito de forças existentes em toda escolha clínica, inclusive na gestão da medicação. Conduzimos desta forma, por entender que ele ocupa um lugar importante quando se pretende problematizar as relações de poder existentes entre pacientes e profissionais de saúde. Assim, o objeto desse estudo está pautado nas inter-relações usuário/trabalhador/serviço de saúde, a quais tornam-se reveladoras dos desafios colocados a atual Política Nacional de Saúde Mental. Adotamos como base a estratégia de gestão autônoma de medicamentos (GAM), pois esse dispositivo tem se mostrado um intercessor potente para trabalhar tais questões. Então, buscando reconhecer seus efeitos naqueles que vivem a experiência GAM, desenvolvemos um estudo hermenêutico-narrativo de caráter qualitativo. Esse estudo fundamentou-se no tripé avaliação, participação e intervenção e teve como sujeitos participantes trabalhadores da rede de assistência à saúde mental e estudantes de especialização em saúde da Unicamp. Foram realizados 9 Grupos de Intervenção GAM (GIs), sendo 4 em Unidades Básicas de Saúde (UBS) e 5 em Centros de Atenção Psicossocial (CAPS). Cada grupo contava com 2 operadores GAM (1 trabalhador e 1 estudante) e 10 usuários de psicotrópicos. Os GIs foram realizados nos serviços de saúde, com encontros semanais e duração média de 7 meses, atingindo nesse período 51 usuários e 29 operadores GAM. A fase de colheita dos dados ocorreu de Julho de 2011 à maio de 2012. Metodologicamente a pesquisa foi construída a partir da triangulação de métodos (entrevista semiestruturada, diário de bordo e oficinas de debate e aprofundamento). As entrevistas foram transcritas e transformadas em metanarrativas através da extração dos núcleos argumentais e após foram validadas por diferentes pesquisadores. O material foi analisado sob a perspectiva Gadameriana. Essa dissertação irá discutir os resultados obtido pelas entrevistas e irá considerar apenas a voz dos trabalhadores da Atenção Básica (8 metanarrativas). A escolha de trabalhar com esse segmento da atenção básica deu-se por entender que a mudança paradigmática resultante da Reforma Psiquiátrica brasileira vem solicitando cada vez mais a atuação desse nível de atenção nos cuidados à saúde mental de sua população adscrita. As falas desses trabalhadores trouxeram à tona a supervalorização do saber científico em detrimento do saber da experiência. Também, desvelaram a existência de modos de restrição da autonomia tanto do usuário como dos profissionais de saúde e as armadilhas que conduzem a medicalização e a restrição da liberdade e do cuidado de si. Ao mesmo tempo, foi possível observar o surgimento de um devir hermenêutico nos participantes do estudo, um movimento de colocar em questão as próprias verdades e as relações de saber/poder existente na clínica.

Palavras-chave: Saúde Mental, Atenção Básica, Autonomia, Psicotrópicos.

luana2014mestrado.pdf (unicamp.br)