A Gestão Autônoma da Medicação (GAM) é uma estratégia de cuidado emancipatório em saúde mental, desenvolvida no Canadá e adaptada ao contexto brasileiro, que visa à produção de autonomia do usuário no contexto de seu cuidado. A partir dos desafios do cuidado em liberdade oriundos do processo da Reforma Psiquiátrica brasileira, tem sido crescente a preocupação com o uso pouco crítico de medicamentos psiquiátricos em serviços de saúde mental. Por outro lado, a questão do consumo de outras drogas, especialmente as ilícitas, tem tomado a centralidade nos movimentos contrarreforma, fazendo avançar a discussão sobre os direitos humanos em contexto de maior vulnerabilidade. Neste estudo, parte-se de uma problematização pouco aprofundada na literatura que propõe uma aproximação entre estas questões a partir da identificação das contribuições da implementação da estratégia da GAM, na organização de um Centro de Atenção Psicossocial de referência para cuidados a pessoas com problemas relacionados ao uso de drogas (CAPS AD), atentando para possíveis peculiaridades do campo de álcool e outras drogas. Trata-se de um estudo de natureza qualitativa, sob o referencial da hermenêutica crítica e narrativa, à luz dos filósofos contemporâneos Hanz George Gadamer e Paul Ricoeur. Os procedimentos utilizados para produção dos dados foram a realização de um grupo focal com os trabalhadores e o registro em diário de campo da experiência de realização de um grupo GAM no CAPS AD do município de Santos/ SP. O exercício hermenêutico interpretativo envolveu a organização dos principais núcleos argumentais, seguidos de construções narrativas elaboradas pela pesquisadora. A partir desse material produzido, buscou-se produzir um diálogo entre usuários e trabalhadores, destacando as principais aproximações e distanciamentos entre estas produções e relacionando-as com autores que dialogam com a temática de álcool e outras drogas. Os resultados da pesquisa apontam para a vivência de alta vulnerabilidade e criminalização do usuário de drogas e as internações recorrentes em Comunidades Terapêuticas, como resposta à pobreza, denunciam a precarização dos serviços de saúde e ausência de outras políticas públicas, além de sua repercussão na descontinuidade do cuidado. Evidenciam, ainda, um desvalor à biografia do usuário na postura médica, bem como a predominância/priorização do tratamento medicamentoso no CAPS AD e indicam a necessidade de radicalizar a discussão dessas prescrições e reorganizar as ofertas de cuidado, propiciando o exercício de cogestão no serviço.
Palavras-chave: Gestão Autônoma da Medicação; medicamentos psiquiátricos; uso de drogas; autonomia; cogestão.